quarta-feira, 27 de abril de 2016

Risíveis Amores

Milan Kundera
Companhia das Letras - 264 páginas

"Atravessamos o presente de olhos vendados, mal podemos pressentir ou adivinhar o que estamos vivendo. Só mais tarde, quando a venda é retirada e examinamos o passado, percebemos o que vivemos e compreendemos o sentido do que se passou..." (página 11)


Kundera nos presenteia com 7 contos deliciosos, que se desenvolvem a partir de uma brincadeira ou mal-entendido e evoluem para desfechos inesperados. Logo de cara, percebi traços de A Brincadeira, que tem o mesmo mote, mas com consequências mais desastrosas.

O conto que mais gostei foi O jogo da carona: um casal de namorados brincam que não se conhecem e ele oferece uma carona para sua namorada-desconhecida. A partir daí, um vai descobrindo traços da personalidade e comportamento do outro, que jamais sonharam imaginar.

Em Ninguém vai rir, um professor universitário recebe uma carta elogiosa ao seu trabalho e pede para que escreva um parecer crítico a uma determinada revista, que recusava publicar um estudo de seu admirador, um tal de Zaturecky. A recusa em escrever essa crítica, já que achara o estudo ruim, e o fato de evitar o contato com Zaturecky transformam a vida pessoal e profissional do professor de tal forma, que ele vê num beco sem saída.

O último conto, Eduardo e Deus, conta o dilema de um jovem apaixonado por uma garota religiosa, que começa a frequentar a igreja para se aproximar mais dela. Porém, esse gesto, é interpretado como uma afronta ao regime comunista onde vive e Eduardo precisa se explicar na escola onde leciona o motivo de sua religiosidade.

"Se eu não pensasse que vivo para alguma coisa maior do que minha própria vida, sem dúvida seria incapaz de viver." (pág. 215)

Kundera não tem pudor em mostrar as contradições da vida e dos nossos sentimentos. Ele questiona o comportamento humano e suas motivações e, mesmo que a situação seja desastrosa ou crítica, ele ainda acha uma brecha para o humor e o riso.

Vale a pena a leitura!

domingo, 10 de abril de 2016

A Garota Dinamarquesa

David Ebershoff
Editora Rocco - 366 páginas

"Era maio de 1929, e ele se daria o prazo de um ano. (...) Se em um ano, exatamente, Lili e Einar não tiverem se entendido, ele viria à praça e se mataria." (página 148)

Einar e Greta moram em Copenhague, são casados e ambos são pintores: ele é bem conhecido e seus quadros vendem bem. Ela, por sua vez, é uma garota que veio da Califórnia e ainda não fez o seu nome conhecido no meio artístico.

Eles se conheceram na faculdade: Einar Wegener era professor de pintura na Academia Real de Belas-Artes e foi professor de Greta Waud. Prestes a completar 18 anos, Greta procurava um par para seu aniversário e, ao ver Einar na escadaria da faculdade, se aproximou e o convidou. O beijo veio em seguida e a certeza de que ele seria o homem com quem se casaria também.

Um belo dia, Greta estava finalizando um quadro de sua amiga Anna Fonsmark, soprano da Ópera Real da Dinamarca, mas encontrava dificuldades para pintar de cabeça. Dependia de um modelo e Anna tivera que faltar aquele dia. Greta, então, pediu um "favorzinho" ao seu marido, ao que ele respondeu: "Claro. O que você quiser." Ela pediu para que ele vestisse as meias e os sapatos de Anna. Ele vestiu e foi como se o mundo tivesse parado: sua vida ganhava um novo significado. Nesse dia nascia Lili, seu outro "eu".

Com sensibilidade, o autor se baseou em um fato real, da vida de Lili Elbe e Gerda, para criar sua ficção. Einar que, aos poucos vai desaparecendo, para dar lugar a Lili, nascera com biotipo feminino (com poucos pelos e de corpo franzino). Com o tempo, ele começa a sofrer sangramentos e, ao procurar ajuda médica, descobre que além disso, nascera com ovários atrofiados. O dilema surge: como conviver com características masculinas e femininas? Quem ele era de fato?

O drama de Einar/Lili nos comove na medida que paramos de julgar e nos colocamos no lugar do próximo. Excelente leitura para desmontar preconceitos e nos fazer refletir: e se fosse comigo? E se fosse com alguém que amamos?




p.s. não assisti ainda ao filme, mas pelo trailer, creio que conseguiram captar a sensibilidade da história.