domingo, 28 de janeiro de 2024

Sociedade do Cansaço


Byung-Chul Han
Editora Vozes - 136 páginas

"O sujeito de desempenho da modernidade tardia não se submete a nenhum trabalho compulsório. Suas máximas não são obediência, lei e cumprimento do dever, mas liberdade e boa vontade. (...) ele ouve a si mesmo. Deve ser um empreendedor de si mesmo. Mas essa liberdade do outro não lhe proporciona emancipação e libertação. A dialética misteriosa da liberdade transforma essa liberdade em novas coações." (página 83)

Você já se perguntou do por quê você se sente exausto, esgotado, sem forças e, muitas vezes, dependendo de terapias e remédios pra conseguir suportar o dia a dia? 

Eu já e não faz muito tempo. Com exceção dos remédios, que evito a todo custo, já me encontrei apenas "existindo", num looping de cansaço, apesar de fazer aquilo que gostava e de não estar passando por nenhum problema sério no momento, como luto, perdas, doença etc. E aí, como explicar?

Nessa obra de 2010, mas cada dia mais atual, o autor explica como a sociedade do século XXI virou uma "sociedade do desempenho", onde não temos a disciplina de antes, dos quartéis, fábricas, etc, mas agora vivemos na era do desempenho e da positividade do poder.

É como se cada um desenhasse o jeito que quer viver, modelar o corpo, a vida, se mostrar nas redes sociais, evidenciar seus talentos (seja no LinkedIn, no Instagram ou qualquer outra rede) e se tornasse escravo de si mesmo.

O excesso de estímulos, informações, impulsos e o incentivo a se tornar alguém "multitarefas" faz com que as pessoas adoeçam e desenvolvam doenças psíquicas como depressão, TDAH, transtorno de personalidade limítrofe ou burnout, por exemplo.

"O excesso de trabalho ou desempenho agudiza-se numa autoexploração. O explorador é ao mesmo tempo o explorado.(...) Os adoecimentos psíquicos da sociedade de desempenho são precisamente as manifestações patológicas dessa liberdade paradoxal." (pág 30)

Achamos que temos liberdade, mas nos prendemos no estilo de vida moderno e, sem querer, nos machucamos até ficarmos esgotados, apesar de sempre termos de nos mostrar fortes, vitoriosos e felizes.

"O sujeito de desempenho esgotado, depressivo está, de certo modo, desgastado consigo mesmo." (pág 91)

O burnout, inclusive, "é uma consequência patológica de uma autoexploração." (pág 97)

Lembro de quando era pequena e as coisas funcionavam "em horário comercial", no escritório/loja e as pessoas conseguiam se desligar do trabalho. Hoje é impossível: se você trabalha, precisa estar disponível em várias redes para falar em reuniões, apresentar projetos, enquanto engole o iFood numa pausa de 15 minutos. Se está desempregada, precisa fazer cursos, se atualizar, manter o networking, cuidar da saúde, se aplicar em 300 sites de emprego, e, claro, sobreviver.

Com a vida online, nem o tempo de mudar de uma sala de escritório pra outra, temos mais. Você sai de um ambiente virtual e entra em outro imediatamente, enquanto acode o filho que chega doente da escola e aciona o pediatra pelo WhatsApp.

O glamour do "tenho uma vida ocupada" está trazendo um preço muito alto e não temos a dimensão do que isso vai se tornar em 10, 20, 30 anos, ainda mais agora com a IA (inteligência artificial) dominando todos os setores da sociedade e economia. 
Quanta gente jovem não é dependente de remédio tarja preta? Um dos mais famosos, inclusive, causa demência a longo prazo e vejo várias pessoas falando que tomam, rindo, até 2, 3 por noite. Como essas pessoas estarão daqui uma década?

A sociedade cobra rendimento, cumprimento de metas, ao mesmo tempo que impõe uma busca constante de felicidade. Por outro lado, vivemos cada vez mais sozinhos, interagindo de forma superficial nas redes sociais, sem de fato interagir em sociedade (que o diga viver apenas de “home office”). O outro desapareceu e nos desgastamos sozinhos e sem apoio. Somos alguém que tem valor - ou não - no mercado e para o mercado.

"A pessoa humana é reduzida ao valor de cliente, ou ao valor de mercado. A intenção que está no fundo desse conceito é que toda a pessoa, toda sua vida é transformada num valor puramente comercial." (pág 127)

Da minha parte, creio que se entendermos onde estamos, o que nos faz bem, a importância de se dar um tempo com aquilo que gostamos, já é um grande passo para não exagerarmos nessa autoimposição de estar sempre na frente, certos e dominando tudo.

O próprio autor não mostra um caminho para rompermos esse ciclo destrutivo, mas reconhece que é necessário "transformar essa casa mercantil novamente numa moradia, numa casa de festas, onde valha mesmo a pena viver." (pág 128)

Boa leitura!

Nenhum comentário:

Postar um comentário